Café de coador
(luiz alfredo motta fontana)
Nhô Cansado, compadre de Sinhá Sensata, andava meio ressabiado.
Tem ouvido coisas demais, e soluções de menos, não tem encontrado, nas conversas, no assuntar, no correr a vista cansada pelos diários, uma herança de seu avô, preciosa herança que sempre utilizou com cuidares, com respeito, sabendo estar tratando com uma virtude.
Sinhá Sensata, enquanto serve o café, ainda pouco saído do coador, observa esse franzir de testa, esse olhar de sanhaço ouvindo algazarra de meninos, esse quase resmungo do Nhô Cansado.
Perguntar o motivo, não comete, ela é do tempo deixar vir, do amadurecer para colher, e assim só espreita.
Entre o picar do fumo e o cortar da palha, na pousada da tarde, ali perto do borralho, Nhô Cansado, após o calmo pigarro, naquele jeito pausado, como quem repassa manteiga no pão caseiro, exclama:
- Comadre!
E manso, como riacho em tempo de seca, acrescenta:
- Esse povo de Brasília, tá perdendo o prumo e o rumo.
- Parece içá caida no terreiro, sem chance de cavar, perdendo asas e vendo o destino chegar no bico do anú.
- Afinal!
Elevando o tom e guardando o canivete:
- Comadre, eles nunca ouviram falar em bom senso?
E nada mais falou, distraído pela chama da binga, aquela mesma que herdara do pai, como o cadinho, ainda vivo, de bom senso ao falar.
O café cheirava como saudade.
Do tempo que escorreu pelo caminho, do olhar o jeito da mocinha sorrir depois do primeiro beijo, do gosto do primeiro trago por conta própria.
Nhô cansado perdido no fumar já não mais franzia a testa.
A tarde retomou seu rumo.
Sinhá Sensata já cuidava do preparo do jantar.
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