terça-feira, 27 de outubro de 2009

Prosa na estante




Maranta arundinacea




(luiz alfredo motta fontana)







Num momento de magia, o pensamento adquire sabores, cheiros, o olhar se fixa no horizonte, e de novo, a infância se torna real.


Ensimesmado nessa vertente do tempo que oscila delicadamente, a mesa do bar, com seus contornos conhecidos e explorados, já não lhe parece a mesma.

Efeitos do scotch?

Mas! Assim, na primeira dose, ainda pela metade, com os primeiros cubos de gelo refletindo as cores do por de sol, que teima em retardar!

Sorri, deixa-se levar, sabe o preço cobrado ao final, a saudade de si mesmo, de todos que vez por outra, aproximaram-se, participaram, e, foram-se nos caminhos do sei-não, sei-lá.

A tragada no cigarro rotineiro, quase lhe provoca a tosse e o enjôo do primeiro.

- Tia Venuta!

Parece vê-la em seu avental enorme, florido, com rendas aplicadas no capricho.

- Tio Dionísio!

Quase uma montanha, quando ao lado da Tia Venuta.

Ela.

Pequena, rápida, distribuindo sorrisos e ralhando ao mesmo tempo.

Ele.

Enorme, pausado, bigodes dourados pela ação do fumo de corda, olhar descansado, posto que coberto pela aba do chapéu.

Sorri! Ramenzoni, a marca do chapéu do tio, e do pai.

Renova a dose, o cheiro do carvalho tenta esconder os outros aromas, mas desiste e se acomoda no copo.

Lembra das tardes, dos pássaros, da mula marchadeira do primo Durvalino, cheia de argolas brilhando, qual bailado, no ir e vir do abrir a porteira.

Hora do lanche, o suor de quem correu, pulou, arregalou os olhos naquele mundo verde.

Hora do lanche!

Sequilhos!

Sequilhos da Tia Venuta.

Diferentes do costumeiro em casa.

Aqueles deliciosos, puro polvilho de Minas, trazido com carinho por Celestino, o primo calado.

Mas estes, só Tia Venuta.

Feitos de polvilho outro, que alguns teimavam chamar de farinha, ofensa imperdoável.

O polvilho de Tia Venuta, cheirava diferente, era de pura Araruta.

Acende um novo cigarro, enquanto o solícito garçon troca o cinzeiro, sorri daquele jeito triste, de quem viveu o "não volta mais", o sol já posto, o scotch recuperando o odor do carvalho.

Pena que Maranta arundinacea, é hoje planta rara, quase extinta, mesmo tendo esse nome popular quase que poético, a Araruta.

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